Como Taylor Swift ergueu império megalomaníaco que ganha forma na ‘Eras Tour’

Depois de viajar os Estados Unidos de costa a costa e estremecer a capital do México e da Argentina, Taylor Swift veio parar o Brasil. Não é exagero. Monitorada por milhares de fãs a bordo de um luxuoso jatinho que decolou de Nova York, a cantora desembarcou no aeroporto internacional do Galeão na tarde desta quinta-feira, na véspera da estreia de sua megaturnê “The Eras Tour” no país.

Assédio dos fãs à parte, o próprio Rio de Janeiro, além de montar um arrojado esquema de trânsito e policiamento para dar conta dos shows nesta sexta, sábado e domingo no Engenhão, vai celebrar a artista com os braços abertos sobre a Guanabara. Após ser importunado com pedidos nas redes sociais, o prefeito Eduardo Paes anunciou que o Cristo Redentor será coberto com uma projeção que homenageia a cantora.

A ver como a estrela vai responder a tamanha honraria, já que a princípio, vai entrar muda e sair calada do país, sem falar com qualquer veículo da imprensa. Prestes a completar 34 anos, e uma década depois de sua última passagem por aqui, a americana chega como uma estrela irrevogável do pop, com dez discos no currículo, e tida como uma das cantoras mais ricas do mundo.

São credenciais invejáveis se comparadas com as que ela tinha quando pisou no Brasil pela primeira e última vez, em 2012, para divulgar o disco “Red”. À época, Swift até já era famosa e respeitada na indústria, mas ainda tentava estourar a bolha da música country, gênero em que apostou no início da carreira.

O sucesso da “The Eras Tour” -que começou em março nos Estados Unidos, passa por São Paulo na próxima semana e se estende até dezembro de 2024, indo para outros continentes-, que já se tornou uma das mais lucrativas da história, é prova do poderio da cantora, hoje dona de um império tão megalomaníaco que escapa das suas mãos.

Segundo o jornal The Washington Post, a turnê movimentou cerca de US$ 5,7 bilhões na economia dos Estados Unidos, onde Swift fez mais de 50 shows. O grupo de rastreamento de shows Pollstar projeta que a arrecadação total da “The Eras” chegue à marca do bilhão no próximo ano.

Com tanto dinheiro envolvido, espera-se algo monumental. São quase três horas de duração, com uma setlist de cerca de 45 músicas que tenta dar conta de toda a discografia de Swift, que já cantou pop, folk, country e música alternativa.

Swift separa os shows em blocos. Começa com a energia fofa do álbum “Lover”, de 2019, e depois atiça a nostalgia dos fãs com as canções de mocinha apaixonada do disco “Fearless”, de 2008.

Depois de três músicas, Swift faz o ritmo cair com as faixas intimistas do disco “Evermore”, de 2020. Neste momento, ela encarna uma persona mística e arrasta um manto preto pelo palco.

Em seguida, Swift troca de roupa de novo e ressurge com pose de diva pop. Vestida com um macacão preto colado no corpo, ela faz cara de má, rebola até o chão e sacode o cabelo ao entoar músicas do disco “Reputation”, de 2017. O show segue com a materialização de álbuns como “Folklore” e “Midnights”.

Quem já viu de perto as diferentes facetas da cantora é a pesquisadora Glenda Mello, uma das poucas pessoas que ouviu a artista cantar ao vivo no Brasil em 2012. À época, Swift fez um pocket show só para convidados e fãs selecionados.

“Hoje a Taylor tem um entretenimento mais forte nos shows. Investiu bastante e aprendeu a dançar melhor. Agora ela faz danças super sexy que antes a sua própria mãe teria vetado”, diz Mello, que mora nos Estados Unidos e já foi a seis shows da cantora.

Foi com o disco “Reputation” que Swift cravou uma imagem de estrela do pop no imaginário popular, afirma Mello. “Ela tinha ficado uns quatro anos sem aparecer, e nesse período criou confiança, mudou e cresceu muito”, diz.

A “The Eras Tour” virou um evento pomposo também devido aos fãs. Os “swifties”, como eles se apelidam, criaram uma série de condutas de comportamento para o show, com folhetos digitais que dizem o que deve ser feito na apresentação.

Fã-clubes se reuniram para definir as regras. Eles pedem, por exemplo, que o público grite “Brasil” na reta final da canção “Blank Space”, e que atire confetes para o alto em “Long Live”.

Há ainda o projeto Eras Lights BR, comandado por 12 voluntários, que vai distribuir pedacinhos de papel celofane verde, amarelo e azul para a plateia. A orientação é que os fãs coloquem o papel em frente à lanterna do celular e iluminem o estádio com as cores da bandeira brasileira durante a música “Champagne Problems”.

Mas, de certa forma, milhares de “swifties” já puderam ver a americana de perto no começo do mês, com a estreia de “Taylor Swift: The Eras Tour”, que mostra nas telonas a turnê quase na íntegra. Numa sessão de estreia no shopping Eldorado, em São Paulo, o cenário era excêntrico.

O escurinho do cinema virou discoteca. A área mais colada à telona ficou cheia de gente de pé, dançando, cantando, batendo palma e gritando ao longo daquela noite. Quase todos usavam pulseiras de miçangas coloridas, inspiradas pela canção “You’re On Your Own, Kid”. Na letra, Swift canta sobre um amor que nunca aconteceu, e diz “faça pulseiras da amizade, curta e aproveite o momento” como lição de moral.

Virou tradição ir ao show com os braços lotados dos acessórios, cujas miçangas formam nomes de músicas ou frases que remetem a Swift. Os fãs trocam os acessórios entre si.

Houve até quem transformou a brincadeira em negócio. A vendedora de miçangas Camila Pires, no ramo há dois anos, diz que nunca teve tanta demanda como nas últimas semanas e que abriria uma loja virtual para dar conta dos pedidos.

Quem também se deu bem com a iminência da chegada Swift ao Brasil foi Caio Faria, criador da loja virtual Bepop, que comercializa roupas e objetos personalizados com estampas de cerca de 80 artistas desde 2020.

Ele conta que a Bepop dobrou o seu recorde de faturamento mensal em outubro, quando lançou uma coleção de camisetas com 42 estampas de Swift. Os produtos dela representaram 86% da renda da loja no mês passado.

Na Bélgica, Swift virou fonte de renda para uma professora de literatura inglesa. Elly McCausland leciona na Universidade de Gante um curso que relaciona as composições de Swift a autores como Sylvia Plath e William Shakespeare.

“Muitas pessoas reagiram mal”, afirma a professora. “Há muitos que são céticos em relação à cultura pop e à Taylor. Investigamos no curso o que isso nos diz sobre sociedade, misoginia e educação. O que estou tentando é fazer com que os alunos apreciem literatura.”

O cambista Bob Júnior se pergunta o porquê de tanto furor. Ele diz ter comercializado cerca de 20 ingressos para os shows de Swift quando as vendas ocorreram em junho. Cobrou entre R$ 2.000 e R$ 2.500 por cada um. Nos canais oficiais, os tíquetes custavam entre R$ 380 e R$ 1.050 -estão todos esgotados.

“Foi muito fora da curva, uma loucura. Nunca tinha presenciado uma venda tão grande como essa”, diz ele, que é cambista desde 1993.

Os fãs de Swift travaram uma guerra com os cambistas. Dezenas de barracas foram erguidas em frente ao Allianz Parque, estádio paulistano que recebe a cantora nos dias 24, 25 e 26 de novembro, nas quais os amantes da cantora disputavam lugares com quem só queria comprar as entradas para revender por um preço inflado. Surgiram brigas no local, o que levou à interferência da Polícia Civil.

Quando Swift visitou o Brasil pela primeira vez, não houve essa baderna. Ela havia lançado há poucos meses uma parceria com a sertaneja Paula Fernandes. À época, as duas se uniram para uma entrevista com a apresentadora Eliana, do SBT, conversa que virou meme por causa da interação dura entre elas.

Swift também ganhou um boneco do papagaio Louro José de um repórter enviado por Ana Maria Braga, presente que recebeu com cara de poucos amigos. Completou o atendimento à imprensa indo ao palco do programa da Xuxa, na Globo, onde foi agarrada pelas pernas por fãs tresloucados na plateia.

Não é de surpreender, portanto, que ela nunca tenha voltado. Mas são águas passadas.

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