Café brasileiro luxuoso é extraído de excrementos do jacu

Antes considerado uma praga nas plantações de café do sudeste do Brasil, o pássaro selvagem jacu – e seu prodigioso sistema digestivo – tornou-se o principal aliado na produção de um dos cafés mais caros do mundo.

O jacu – jacuaçu – parece um faisão e tem paladar fino: “Geralmente ele escolhe as melhores frutas, as mais maduras”, explica Agnael Costa, de 23 anos, à AFP, enquanto coleta delicadamente os valiosos excrementos entre duas árvores.

Na fazenda Camocim, situada em um vale bucólico da comunidade de Domingos Martins, no Espírito Santo, os pés de café crescem em meio a uma floresta exuberante.

“Foi esse sistema agroflorestal que criou as condições necessárias para existir esse café exótico aqui”, explica o proprietário Henrique Sloper, adepto da agricultura biodinâmica, sem produtos químicos.

O produto é vendido por 1.118 reais o quilo no Brasil, e ainda mais caro no exterior, em lojas de luxo como a britânica Harrods.

De inimigo a aliado

Mas o jacu, espécie de plumagem preta e garganta escarlate, nativa de outras regiões da América do Sul, nem sempre foi bem-vindo na propriedade Camocim. No início, era visto como uma praga que ameaçava as colheitas e causava problemas. Foi ao conhecer o café “Kopi Luwak” na Indonésia, feito com excrementos de civeta (mamífero asiático semelhante a um mangusto), que Henrique Sloper teve a ideia de transformar o jacu de inimigo a aliado.

Enquanto a reputação do “Kopi Luwak” – também vendido a preço de ouro – é prejudicada por denúncias de maus-tratos a civetas em cativeiro, o jacu brasileiro cresce em liberdade.

“É 100% natural. O jacu está dentro do habitat natural dele mesmo”, a floresta atlântica do litoral brasileiro, diz o supervisor de produção, Rogério Lemke. “É uma região muito protegida (…) e não usamos químico, produtos transgênicos, nada” na plantação de café, acrescenta.

Os excrementos do jacu lembram a aparência de um pé de moleque, com grãos de café incrustados em uma pasta enegrecida. Depois de colhidas, as fezes são colocadas para secar em uma estufa. Em seguida, os grãos de café são classificados e descascados cuidadosamente, antes de serem colocados em uma câmara fria. São retirados de lá apenas mediante solicitação do cliente, para evitar desperdícios.

“Em função do trabalho que a gente tem para fazer esse produto, ele é naturalmente caro. Não tem como fazer um café de jacu com custo baixo… É um produto escasso e a produção é incerta, porque depende do apetite do jacu”, afirma Henrique Sloper.

O café extraído dos excrementos destas aves representa menos de 2% da produção da fazenda. “Serve não só como selecionador, como também alarme de colheita. Onde ele come, o café está maduro”, explica.

Luxo e sustentabilidade

“Os pássaros têm um transito intestinal extremamente curto. Praticamente entrou, e depois de alguns segundos já está saindo. Então não existe propriamente qualquer tipo de processo bioquímico, não dá tempo”, explica o analista de café, Ensei Neto.

É muito mais lento em civetas ou elefantes, cujos excrementos também são usados para produzir esse tipo de café na Tailândia.

“Basicamente, o que você tem como diferencial, que o pássaro promove, é essa seleção dos grãos maduros. Ele não adiciona nada a mais. Mas a história é boa”, diz Neto.

Os grãos bem maduros conferem ao café “notas doces, com boa acidez”

“É um café delicioso e a história por trás da sua produção é muito original. É uma experiência nova para nós”, diz a turista Poliana Cristiana Prego, de 37 anos, que veio até a fazenda provar o café do jacu.

“Nossos clientes são os amantes de produtos exóticos, mas também aqueles que valorizam a ideia de desenvolvimento sustentável”, afirma Henrique Sloper.

Para ele, “o futuro do café vai vir do Brasil”. Maior produtor mundial, o gigante sul-americano começa a melhorar “a parte do branding, do marketing do café. É mostrar para o mundo que realmente temos condições de fazer o que ninguém tem”.

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