Ministério decide criar grupo para conter violência contra indígenas no sudoeste da Amazônia

O MPI (Ministério dos Povos Indígenas) decidiu instalar um grupo de trabalho para adoção de ações contra o quadro de desnutrição, abandono e violência enfrentado pelos madihas kulinas, no sudoeste da Amazônia.

A decisão da pasta foi comunicada a integrantes do poder público na quarta-feira (13), após a Folha de S.Paulo mostrar em reportagem a realidade de sistemática violação de direitos dos indígenas. No começo da noite de ontem (14), o MPI confirmou a decisão de instalação do grupo de trabalho.

Integrantes do ministério estiveram na região entre 22 e 26 de agosto. “Diante da situação de alta vulnerabilidade identificada entre os povos da calha do rio Juruá, decidiu-se pela instalação de um grupo de trabalho para tratar das necessidades identificadas”, disse a pasta, em nota.

“O GT está em fase de elaboração e será composto por organizações da sociedade civil, órgãos do governo federal e prefeituras locais, para implementar ações de combate à desassistência que os povos vêm enfrentando e, assim, garantir a efetiva presença do Estado na região.”

O MPI, a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e a Sesai (Secretaria de Saúde Indígena) já haviam assinado, em agosto, termos de compromisso com o MPF (Ministério Público Federal) no Amazonas e com as prefeituras de Eirunepé (AM) e Ipixuna (AM) para apoio a uma rede de atenção aos madihas kulinas e a outros povos da região.

Na reportagem publicada na quarta, a Folha de S.Paulo revelou o conteúdo de relatórios e imagens compartilhados com o escritório da ONU para prevenção de genocídio.

O material foi enviado em 11 de maio de 2023 e aponta uma realidade de desnutrição infantil, insegurança alimentar, abandono, estupro, suicídio e mortes violentas de madihas kulinas.

A violação aos direitos desses indígenas, descrita em documentos e fotos, inclui retenção de cartões de benefícios sociais e uma rede de dívidas contraídas por quem vai às cidades mais próximas dos territórios tradicionais para acessar o Bolsa Família.

Descrições em texto e registros do armazenamento de parte das fotos apontam datas de 2023, o primeiro ano do atual mandato de Lula (PT). Para outra parte das imagens não há precisão sobre datas.

A iniciativa de denunciar a realidade dos madihas kulinas à ONU foi de um grupo de entidades, com a participação do MPF, diante da gravidade do problema, da escalada dessa situação a partir de 2010 e da ausência de solução por parte do poder público.

Pelo menos uma foto inserida na denúncia mostra uma criança com indicativo de desnutrição grave. Há imagens ainda de abandono dos indígenas em cidades no sudoeste do Amazonas, como Ipixuna,

Eirunepé e Envira; corpos de indígenas com sinais de agressão e violência; e espera por atendimento em saúde.

Os madihas kulinas estão em dez terras indígenas, especialmente no médio rio Juruá (AM) e no alto rio Purus (AC). Eles também estão no Peru. As informações são do banco de dados elaborado pelo ISA (Instituto Socioambiental), que aponta a presença de 7.200 indígenas nesses territórios no Brasil.

Os quadros de violência e desrespeito aos direitos humanos se intensificaram ao longo dos anos em razão da maior presença de indígenas em cidades, em busca de benefícios sociais. Essa distorção do sistema de assistência, que provoca longas jornadas e improvisos de hospedagem nos municípios, é apontada pelo MPF em ações contra a União.

A realidade é a mesma para madihas kulinas, pirahãs, hupdahs, yuhupdehs e yanomamis em cidades do Amazonas.

Um relatório antropológico do MPF sobre os madihas kulinas, enviado à ONU, aponta abuso de álcool entre os indígenas, mortes por afogamento, suicídios e homicídios. São comuns agressões por parte de não indígenas, num ambiente de discriminação e preconceito nos núcleos urbanos. Mas também são frequentes agressões entre indígenas e familiares, associadas ao abuso de álcool.

Entre 2011 e 2016, houve registro de 34 casos de suicídio entre madihas, conforme dados de saúde indígena referentes à área de abrangência de três cidades.

Quando esteve na região, em agosto, o MPI disse ter dialogado com lideranças dos povos kulina, denin e kanamari. A pasta afirmou ter acatado as demandas feitas.

“As demandas estão, de modo geral, relacionadas às dificuldades de acesso dos indígenas aos programas de promoção aos direitos sociais e às políticas de educação e saúde”, disse o MPI na nota. “Foram narradas ainda pelas lideranças várias situações de violência sofrida quando da estadia dos indígenas nas sedes dos municípios.”

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